Waldemiro Gremski nasceu em uma região chamada Serrinha, então pertencente à Lapa e hoje parte de Contenda, em 22 de fevereiro de 1945. Porém, por algum motivo nunca explicado, a data de nascimento em seu registro é 23 de abril de 1945. Um curioso relato de Gremski expõe que toda a família, de comum acordo, havia decidido que seu nome seria Casimiro, um nome pomposo e de grande impacto dado a importantes reis e santos da Polônia, sendo até hoje de uso muito comum naquele país. Aos 11 anos de idade, sua professora da Escola Pública São Miguel, D. Maria Bora, solicitou-lhe o registro de nascimento e surpreendeu-se ao ler o documento, em que constava o nome Waldemiro. Só então todos descobriram seu nome real. “Meu pai e minha mãe nunca souberam, mas a mudança me agradou muito. Qual a razão dessa confusão? A única coisa que posso inferir é que, como o cartorário de Contenda chamava-se Waldemar e era amigo de meu pai há muitos anos, certamente a confecção do registro do meu nome foi apenas um detalhe secundário de uma visita que ensejou uma longa conversa, talvez regada por alguns aperitivos etílicos”.
Embora nascidos no Brasil (1.ª geração de imigrantes), o pai João Gremski (nascido em 1894) e a mãe Catarina Stabach (nascida em 1899) viviam uma realidade totalmente polonesa: todos falavam, rezavam e brigavam em polonês e divertiam-se de acordo com as tradições do país europeu. Casamentos, batizados, velórios, missas, danças, além das vestimentas de homens, mulheres e crianças, tudo tinha a ver com a origem polonesa da região. Aprendeu o português somente aos 7 anos, quando foi à escola.
Ligados à agricultura, o pai foi o primeiro a adquirir um trator e uma colheitadeira de grãos na região, em 1949. Seus pais preocupavam-se com cultura e educação, por isso assinavam o jornal Lud (O povo, em polonês) e várias revistas, a maioria editada em polonês pela Igreja Católica.
Na infância, vivia em um ambiente profundamente religioso, de muitas orações no dia a dia e de grande solidariedade. Esse ambiente de sacralidade o encantava, tendo até mesmo atuado como coroinha na comunidade. Após as celebrações, comentava com a mãe sobre seu interesse em ser padre. Realidade que se cumpriu quando, em uma visita do padre a sua casa na kolenda, seu pai mencionou o interesse pelo sacerdócio.
Aos 11 anos (1956), encaminhado pelo padre, foi para o Seminário Menor São Vicente de Paulo, em Araucária, pertencente à Congregação da Missão (vicentinos), com o objetivo de se tornar sacerdote. Contando com vários padres, a maioria poloneses, o seminário era um ambiente de extraordinário nível cultural.
Seminário Menor São Vicente de Paulo, em 1960, encerrando o Ginásio, com o Pe. Domingos Wiśniewski, Diretor.
Quando concluiu o então ginásio, em 1961, mudou-se para o Seminário Maior, em Curitiba. Era um local de riqueza cultural e religiosa, com debates desde as linhas filosóficas e teológicas até questões políticas e ideológicas que agitavam o país naquela época. Entre as várias atividades que teve a oportunidade de desenvolver, cabe ressaltar a função de redator de uma revista bimestral por quase dois anos, editada pelos estudantes vicentinos, chamada Entre amigos, fértil de notícias e debates relacionados à vida vicentina e eclesiástica.
Em 1965, após longa e profunda reflexão, deixou o seminário. Em poucos dias dentro da nova realidade, que no início parecia quase selvagem, começou a trabalhar como locutor da Rádio Tingui (atual Capital), expondo seu belo timbre de voz. Na rádio, acabou perdendo seu sotaque polonês e teve a oportunidade de entender melhor a vida, seu lado bom e mau, e vivenciar certo glamour, pois à época a rádio Tingui era o grande reduto da jovem guarda curitibana.
Também logo após sair do seminário, um fato que definiu boa parte de sua vida dali em diante ocorreu. Em passagem pela Igreja da Ordem, encontrou um antigo conhecido com quem havia estudado no seminário, Dr. Leonardo Belniak. O colega perguntou se ele não estaria interessado em morar em uma casa que os padres (da Ordem) tinham no bairro Hugo Lange, anexa à igreja. Ficaria na casa como uma espécie de caseiro, o que significava que não haveria necessidade de pagar. Aceitou imediatamente e lá morou por sete anos. Foi lá que conheceu sua futura esposa (à época com o nome Lillian Cathy Mickus), além de morar na região até hoje (Jardim Social).
Casou-se com Lillian, que também é professora, em 1973. Segundo Waldemiro, a esposa o “incentivou, apoiou, acompanhou em todas as etapas difíceis, tristes, alegres, etc. Mãe dos meus quatro filhos maravilhosos, que só nos trazem alegria até hoje. Um deles, infelizmente, não vive mais entre nós – a minha Isabel Cristina que, aos 14 anos, nos foi retirada tragicamente. Ana Paula está há muitos anos nos Estados Unidos com o marido, Gustavo, e duas filhas maravilhosas, Sofia e Clara; Luiza Helena, professora na UFPR, que mora próximo de nós com o marido Guilherme e dois filhos maravilhosos, Eduardo e Leonardo; e João Felipe, poeta e escritor, que vive junto a uma companheira maravilhosa”.
Formatura 1969 em História Natural na Universidade Católica do Paraná (hoje PUCPR).
Gremski tem um currículo impressionante. Em 1966, iniciou o curso de História Natural (hoje Ciências Biológicas) na então Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade Católica do Paraná, concluído ao final de 1969. Foi quando teve a oportunidade de passar por uma experiência única nos Estados Unidos, patrocinada por uma entidade universitária americana. Uma das atividades previstas no programa era uma estada na Universidade de Harvard, onde participou de um curso de várias semanas sobre a importância da liderança estudantil, decisivo em sua vida, pois abriu os horizontes do significado da universidade, sua abrangência e objetivos.
Nesse período, após deixar a Rádio Tingui, passou a lecionar no Seminário dos Sagrados Corações, em São José dos Pinhais. Ao se formar na universidade, fez concurso para professor do ensino básico estadual, tendo lecionado dois anos no Colégio Júlio Szymański, em Araucária.
No decorrer do curso, pelo fato de ter exercido a presidência do Diretório Acadêmico da Universidade, acabou assumindo atitudes que contrariavam o regime vigente (ditadura militar), como pedidos de respeito aos direitos humanos e o fim da tortura, tudo aquilo que jovens idealistas daquela época faziam e cuja ação foi fundamental para a reconquista da democracia. Isso lhe custou problemas pessoais de grande magnitude por mais de 10 anos, pois foi enquadrado em dois inquéritos. Foi um período em que teve muita dificuldade em sua função profissional, já que, embora tivesse sido absolvido em 1970 e 1971 dos dois processos, o governo de então não autorizou o silêncio na ficha de incurso da Lei de Segurança Nacional na Delegacia de Ordem Política e Social (DOPS). Um dos problemas foi a enorme dificuldade em sair do país para participar do programa nos Estados Unidos, anteriormente citado. Outro foi o impedimento em assumir sua função na UFPR como professor auxiliar, em 1971, após amplo concurso. Em 1972, sob ordem do DOPS, aconteceu sua demissão. Felizmente, após análises no âmbito militar, foi readmitido na universidade.
Em 1973, foi aprovado no curso de doutorado em Histologia da USP, quando surgiu o convite para realizar estudos na Universidade de Estocolmo, no Instituto Karolinska, com foco em Biologia Celular e Molecular. Além de realizar um trabalho de pesquisa aprofundado durante um ano sob a orientação de um cientista de renome internacional, Dr. Bjorn Afzelius, foi possível ter contato pessoal com os ganhadores do Prêmio Nobel de 1977.
Retornando ao Brasil, houve dedicação integral à pesquisa, quando estruturou, na UFPR, o curso de pós-graduação em Biologia Celular, em 1979. Foram anos de alta produção científica e formação de recursos humanos, interrompidos em 1984/1985 com um pós-doutorado na Universidade de Connecticut. De volta ao Brasil, prestou concurso para professor titular em Biologia Celular na UFPR, em abril de 1986.
Gremski também tem uma longa e bem-sucedida trajetória como gestor universitário. Ao retornar dos Estados Unidos, assumiu, em 1987, o Centro de Microscopia Eletrônico da UFPR, que até hoje é um dos centros de renome do país, contando com equipamentos de última geração na área e atendendo todo o Paraná e Santa Catarina. Em 1988, foi convidado a voltar à Universidade de Connecticut como professor visitante no curso de Medicina.
Na sequência, no período de 1990 a 1994, exerceu o cargo de diretor do Setor de Ciências Biológicas da UFPR. Após retornar de mais um pós-doutorado, realizado de 1995 a 1997 no Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, em São Paulo, assumiu a coordenação do programa de pós-graduação em Biologia Celular da UFPR.
No início de 1998, foi convidado a assumir a Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da UFPR e ali permaneceu até abril de 2002. A UFPR passou a ser uma das 10 maiores instituições em termos de pós-graduação no Brasil, tanto em quantidade como em qualidade. A atuação de Waldemiro fez a UFPR estar presente em todos os eventos relacionados à pesquisa e pós-graduação. No Paraná, sob sua liderança, foi fundado o Conselho Paranaense de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação das Universidades Paranaenses, entidade que tem presença em todos os fóruns relacionados à ciência e tecnologia do estado, entre eles a Fundação Araucária.
Exerceu os cargos de vice-presidente e presidente do Fórum Nacional de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação durante três anos (1999/2002). Nesse período, foi membro do Conselho Superior da Capes e do Conselho Técnico-Científico, responsável por analisar todos os pedidos de funcionamento dos cursos de pós-graduação do país. Nesse cargo, e atuando em conjunto com o Fórum de Secretários de Ciência e Tecnologia do país, foi possível mudar a atuação da Capes, tornando-a uma agência mais ágil e menos burocratizada em sua relação com as instituições de ensino.
Em sua atuação à frente do Fórum, foram desenvolvidos planos regionais de pesquisa e pós-graduação pelos ministérios de Ciência e Tecnologia e da Educação. Liderou esse processo durante vários anos, quando vivenciou um dos períodos mais ricos da história brasileira em termos de pesquisa e pós-graduação, tanto no país como no Paraná.
No decorrer de 2001 e 2002, houve um trabalho conjunto entre o Conselho Paranaense de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação do Estado do Paraná e a Secretaria de Ciência e Tecnologia (com iniciativa do então secretário Wahrhaftig), no intuito de estabelecer relações de Ciência e Tecnologia (C&T) entre o Paraná e os países da Europa de onde vieram levas de imigrantes nos séculos XIX e XX, entre eles a Ucrânia e a Polônia. Tendo em vista o fato de Waldemiro se encontrar a par da realidade de C&T no Paraná e de falar o idioma polonês, o secretário lhe confiou as negociações nessa área com aquele país. Duas áreas foram definidas como foco da relação bilateral: a biotecnologia e a ciência dos materiais. Do lado brasileiro, houve um grande envolvimento do Consulado Polonês de Curitiba, da Embaixada da Polônia e da área de C&T do Itamaraty, que instruiu o embaixador brasileiro em Varsóvia a dar todo o suporte às negociações, o que de fato ocorreu. Tudo transcorreu de maneira a se estruturar uma relação bilateral aprofundada, tanto para bolsistas como para pesquisadores. Toda a parte legal havia sido concluída, porém, o governo que assumiu o Paraná em 2003 não teve interesse em continuar essa parceria. Deve-se ressalvar que a Polônia manifestou total interesse nessa relação, haja vista o tratamento dado às delegações paranaenses naquele país, que foram recebidas pelas mais altas esferas governamentais relacionadas ao tema.
Em 2002, ao se aposentar na UFPR, assumiu a coordenação do Laboratório de Engenharia e Transplante Celular da PUCPR, projeto que fora estruturado entre a universidade e a Secretaria de Ciência e Tecnologia do estado do Paraná. O referido laboratório tem até hoje objetivos ambiciosos em relação à pesquisa com células-tronco. Ainda na PUCPR, estruturou um programa de pós-graduação em Ciências da Saúde, o qual foi aprovado pela Capes em nível de mestrado e doutorado.
Waldemiro trabalhou no Ministério da Educação, na equipe do ministro Cristovam Buarque, como diretor do Departamento de Modernização e Qualificação do Ensino Superior de janeiro de 2003 a março de 2004. Essa experiência é considerada por ele uma das mais importantes e fascinantes de sua vida. Hospitais universitários foram reequipados, projetos foram criados para modernizar e atualizar as bibliotecas das universidades e informatizar as instituições federais de ensino superior. Além disso, um dos programas mais conhecidos do país foi criado, o ProUni. Atuou na elaboração da Lei de Inovação Tecnológica, hoje em vigor, foi membro da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança do MCT, a CTNBio, onde permaneceu até março de 2005, e foi responsável pelo controle de plantio, manuseio e pesquisas de qualquer organismo geneticamente modificado no país, participando ativamente da discussão da Lei de Biossegurança.
Após retornar de Brasília, em 2004, continuou como coordenador do Programa de Ciências da Vida, lecionando e assumindo a orientação de alunos do mestrado. Em 2006, assumiu a Diretoria de Pesquisa e Pós-Graduação da PUCPR. No período, foram adotadas várias iniciativas relacionadas à área. Em 2011, assumiu a Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (PRPPG), dando continuidade às atividades em curso. É importante salientar que no período foi criado um número significativo de programas de pós-graduação, chegando a 16 mestrados e 13 doutorados. As avaliações realizadas pela Capes mostraram uma evolução de qualidade extremamente rápida.
Reitor da PUCPR – Posse em 2014.
Em dezembro de 2013, assumiu a reitoria da universidade pelo período de oito anos, em dois mandatos. Foi uma gestão muito movimentada. A equipe foi composta por pessoas com alto conhecimento sobre a realidade da universidade e o que teria de ser adotado para colocá-la e mantê-la conforme os desafios, não apenas os atuais, mas, principalmente, os do futuro.
Enquanto reitor da PUCPR, em 2018, foi eleito presidente do Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (CRUB), entidade que representa todo o sistema universitário do país perante o governo, o Congresso e demais entidades públicas e particulares. Exerceu essa função até meados de 2021, quando completou o mandato à frente da PUCPR.
Recebendo o título de Reitor Emérito da PUCPR (2024).
Em 2024, no mês de abril, por decisão do Conselho Universitário da universidade, foi concedido a Gremski o reconhecimento como Reitor Emérito da PUCPR, o que o mantém ligado à universidade como a terceira autoridade da instituição.
Publicou mais de 70 trabalhos científicos, a maioria dos quais (46) em periódicos internacionais e de bom impacto na área, e orientou um grande número de estudantes de diferentes cursos, em vários níveis: iniciação científica (mais de 50), mestrado e doutorado (mais de 30). Hoje, eles encontram-se espalhados por diferentes universidades em vários estados e ocupando posições de destaque, tanto na pesquisa como na administração universitária.
E foi assim que Waldemiro Gremski, que cresceu envolto pela língua, fé e tradições polonesas, dedicou boa parte de sua vida à ciência e à educação brasileiras.
Alameda dos Reitores, inaugurada em 2020 com árvores da espécie Oliveira, representando cada reitor da Universidade.
Texto de Waldemiro Gremski editado por Thaisa Socher.