Bruno Lechowski nasceu em 1887, em Varsóvia. Suas famílias por parte de mãe e pai, Reszkow e Lechowski, ofereceram a ele uma formação artística e intelectual muito avançada. A família Reszkow já era conhecida pelo seu lado artístico, com cantores de ópera de fama internacional. Revelando disposição para a música, Bruno Lechowski recebe aulas de violino, apresentando-se em recitais e atuando como compositor. Sua formação também tem forte conteúdo humanitário e pacifista. Em 1909, frequenta a Escola de Belas Artes de Kiev, Ucrânia, completando seus estudos em São Petersburgo, Rússia. Entre 1914 e 1921, alista-se como voluntário para auxiliar os feridos nos conflitos russo-poloneses. Desde cedo, realiza diversas exposições e é premiado. Passa a integrar o quadro de professores da Academia Nacional de Belas Artes, em Varsóvia, e organiza, nas propriedades da família, uma escola de orientação artística e profissional para crianças e jovens sem recursos. Seu ideal de arte faz com que, entre 1922 e 1924, crie o projeto de uma Casa Internacional do Artista. Prevendo instalar sedes em vários países para receber artistas de todos os lugares do mundo, a Casa ofereceria condições para estes se hospedarem, relacionarem-se com os colegas de vocação artística, produzirem suas obras livres de preocupações cotidianas e das demandas do mercado (que apenas degradaria o valor e o caráter universal da arte, do qual o artista seria um veículo), além de exporem suas obras sem custos. Para conseguir tal intenção, Lechowski se propõe a realizar uma aventura artística: apostar que conseguiria percorrer todos os continentes do mundo em um prazo de três anos, sem dinheiro, comunicando-se apenas em polonês e vivendo exclusivamente do resultado de seu trabalho artístico. Caso fosse bem-sucedido no seu intento, receberia o prêmio da aposta quando voltasse para a Polônia. Assim, comprovaria que a Arte é uma linguagem universal e, consequentemente, a viabilidade do projeto. O dinheiro resultante da aposta serviria para a instalação da primeira sede, em Varsóvia. Antes de partir de Varsóvia, monta sua primeira exposição portátil – uma tenda de lona desmontável – em uma praça pública. Até o Chefe de Estado Jósef Pilsudzki lhe deseja boa sorte. Viaja inicialmente pelo interior da Polônia, depois por diversos países europeus, expondo em parques e praças o que vai produzindo. Por vezes, Lechowski fazia sorteios dos seus quadros e também presenteava quem admirasse suas pinturas, mas não tivesse condições de comprá-las. Embarca para a América do Sul. Lechowski custeia a passagem de navio retratando os passageiros. Como sua aposta teve grande repercussão, os passageiros do navio colaboravam com o projeto dele. Desembarcou no Rio de Janeiro no início de dezembro de 1925. Jamais sairia do Brasil. Realiza sua primeira exposição em terras brasileiras no Liceu de Artes e Ofícios, no Rio de Janeiro, apresentando impressões de viagem e os primeiros trabalhos sobre aspectos da paisagem física e cultural do novo país. Partindo do Rio de Janeiro, Lechowski percorre o litoral paulista, chegando ao Paraná em fins de janeiro de 1926, onde encontra, em Curitiba, a comunidade de imigrantes poloneses. Apresenta seus quadros no Consulado da Polônia, participa da movimentação cultural da cidade, faz decoração de carnaval e convive com a nova geração de artistas e intelectuais paranaenses, como João Turin, Alfredo Andersen, Theodoro De Bona, Estanislaw Traple, Lange de Morretes, Léo Cobbe e Coelho Jr. Viajando por núcleos coloniais ou pelas cidades do interior e do litoral, o artista permanece dias na contemplação da natureza nativa da região, estudando variações formais e cromáticas, experimentando novas técnicas e materiais de pintura. Sua produção é constituída principalmente de aquarelas e paisagens. Voltando a Curitiba, inaugura, em um terreno baldio murado na Praça Zacarias, sua exposição portátil. Nos pilares do portão do local, o artista coloca duas grandes bandeiras, uma do Brasil e outra da Polônia, e cobra entrada dos interessados em apreciar a arte em exposição. A presença de Lechowski em Curitiba é considerada mágica, sendo suas propostas vistas como revolucionárias no uso das cores e na total liberdade de interpretação da natureza. Pode-se, inclusive, afirmar que Lechowski é responsável pelo pré-expressionismoparanaense. Depois de permanecer em Curitiba por alguns anos, Lechowski volta a São Paulo, onde, com o arquiteto Domaradzki, abre um escritório de arquitetura e publica o álbum Projetos Arquitetônicos para Residências Modernas Brasileiras. Com a colônia polonesa, funda o Centro de Artes e Ofícios, no qual instala uma tecelagem, uma fábrica de brinquedos e um teatro para o qual escreve peças infantis. Transfere-se para Ubatuba, onde monta um pequeno laboratório de pesquisa sobre a flora brasileira, produz pigmentos naturais e estuda a aplicação de plantas na cura de moléstias, além da cura pela imposição das mãos. Em 1931, Lechowski chega novamente ao Rio de Janeiro, onde participa da fundação do Núcleo Bernardelli, uma agremiação de artistas que oferecia cursos e práticas artísticas com a intenção de constituir uma alternativa ao conservadorismo da Escola Nacional de Belas Artes no ensino da arte, democratizando-o, e que teve importante papel na difusão do modernismo no Rio de Janeiro. Lechowski torna-se um dos principais mentores do Núcleo, exercendo grande influência sobre as produções de artistas como José Pancetti e outros futuros ícones da pintura brasileira. Incentiva a representação da natureza e da cidade em expedições ao ar livre. Leva seus alunos para aulas na orla, nas ilhas, no alto dos morros ou nos últimos andares dos primeiros edifícios modernos da paisagem carioca. Lechowski também retoma o projeto da Casa Internacional do Artista. Em 1932, com ajuda de Oswaldo Teixeira, então diretor do Museu Nacional de Belas Artes, consegue instalá-la em sede provisória. Apresenta seu novo modelo de exposição portátil com o objetivo de popularizar a arte, tendo este sido chamado de Cineton. Participa dos mais importantes salões e exposições da década de 1930, recebendo, entre outros prêmios, a Medalha de Prata no Salão Nacional de Belas Artes, em 1934. Em 1938, recebe a Medalha de Honra do Governo Polonês pelo serviço à Arte. O recrudescimento dos conflitos internacionais diminui seu entusiasmo, e ele sofre profundamente com a invasão da Polônia, em 1939, pela Alemanha nazista. Transforma sua casa e atelier, localizado na Ladeira da Glória, em um local de acolhimento a refugiados de guerra. No ano seguinte, muda-se para um sítio em Campo Grande, nos arredores do Rio de Janeiro, onde, com agricultores locais, funda uma cooperativa agrícola e ajuda refugiados poloneses a se adaptarem e a se organizarem. Em decorrência de problemas cardíacos – e talvez pelo sofrimento decorrente de se ver em um mundo em guerra, um mundo tão diferente do que idealizara –, o artista morre subitamente em 1941, aos 53 anos de idade. Em 1942, o Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, realizou uma exposição póstuma em sua homenagem. Após sua morte, suas obras também integram diversas exposições coletivas. No fim dos anos de 1980, sua vida e obra despertam o interesse de um grupo de pesquisadores e artistas do Museu de Arte do Paraná (hoje Museu Paranaense), cujo extensivo levantamento documental, biográfico e de sua obra resultou na exposição “Bruno Lechowski, a Arte como Missão”, em 1991, nas três capitais onde morou, ou seja, em Curitiba, no Museu de Arte do Paraná, em São Paulo, no Museu Lasar Segall, e no Rio de Janeiro, no Museu Nacional de Belas Artes. Exposições individuais e homenagens ao artista continuam a acontecer. Em 2001, a Secretaria da Cultura do Estado do Paraná viabilizou a exposição “A Arte de Bruno Lechowski no Brasil: 1925-1940”, na Casa Andrade Muricy, em Curitiba. Em 2006, o Museu Oscar Niemeyer, de Curitiba, com o Ministério das Relações Exteriores do Brasil, organizou a mostra itinerante “Bruno Lechowski”, que passou pelas embaixadas brasileiras em Londres, Berlim, Varsóvia e Cracóvia, antes de retornar a Curitiba. Apesar de ter permanecido no Brasil por apenas 16 anos, Lechowski é, sem dúvida, uma das presenças mais marcantes entre os artistas estrangeiros fixados em nosso país no século XX.
(Coautoria: Heliana Grudzien e Ivi Belmonte)
