Irene Palulis (assim é seu nome de batismo) nasceu em 1927 em Curitiba, Paraná, Brasil. Seus pais, Ceslawa Dorabiallo e Stanislaw Palulis, eram imigrantes poloneses. Ativa na resistência contra a ocupação russa na Polônia, a família de Ceslawa, quando ela tinha 9 anos de idade, deixou Lublin após o desaparecimento de um de seus membros, desembarcando no Rio de Janeiro em 1909. Stanislaw chegou ao Brasil vindo de Varsóvia em 1925, aos 26 anos de idade. Fazia parte de uma família de músicos, alguns dos quais integravam a orquestra sinfônica de Varsóvia. Ceslawa e Stanislaw se estabeleceram em São José dos Pinhais, Paraná, onde se conheceram e se casaram. Pouco tempo depois, mudaram-se para Curitiba. Na casa em que moravam, Stanislaw abriu um pequeno armazém e fazia consertos mecânicos, enquanto Ceslawa cuidava da casa e da horta. Nenhum dos dois, entretanto, abandonou seus hábitos culturais: estavam sempre compartilhando histórias sobre a Polônia, lendo literatura clássica polonesa, ouvindo e cantando ópera, tocando instrumentos musicais, aprendendo diversas línguas, pintando as paisagens do jardim. Irene Palulis nasceu e cresceu nesse ambiente de criatividade e pesquisa e foi estimulada desde cedo ao contato com as artes, sendo que o desenho e a pintura logo se tornaram seus meios de expressão favoritos. Recebeu aulas de Oswald Lopes quando criança e de Guido Viaro quando adolescente. Interrompeu seus estudos artísticos para estudar Odontologia na Universidade Federal do Paraná, formando-se em 1950. Voltou a se dedicar às artes plásticas em meados da década de 1970, quando fez curso de desenho, pintura e gravura com Fernando Ikoma e Luiz Carlos de Andrade Lima, além de diversos outros cursos, tais como História da Arte, no Atelier Alfredo Andersen. Foi lá que, em 1979, realizou sua primeira exposição individual: “Irene Belmonte: gravuras e pinturas”. Irene demonstrava, com as obras desse período, uma preocupação humanista e crítica, retratando as figuras humanas na simplicidade de seu cotidiano, ou na profundidade de seus dilemas e dores. O interesse pelo país de origem de seus pais jamais arrefeceu e, em 1980, altamente recomendada por Luiz Carlos de Andrade Lima, conquistou bolsa de estudos de um ano na Academia de Belas Artes de Varsóvia, onde se aperfeiçoou nas técnicas de gravura com Halina Chrotowska e Henry Opalka. O contato com a cultura e a arte polonesa marcaram seus temas, técnicas e visão de si mesma como artista, tanto que passou a adotar “Palulis”, o sobrenome paterno polonês, como nome artístico. Quando voltou a Curitiba, estudou Criatividade e Composição com Suzana Lobo, no Museu Guido Viaro, e participou de diversos salões e exposições coletivas, sendo premiada com Medalha de Prata e Menção Honrosa na I e III Mostra Rosacruz de Arte. As exposições individuais que realizou em seguida, em especial a intitulada “O jogo da vida”, mostraram um estreitamento cada vez maior da relação entre espiritualidade e arte em seu processo criativo. Palulis passa a conceber a experiência estética como um modo de conhecer e compreender o mundo suprassensível, bem como uma forma de meditação e comunhão. Seu tracejado vigoroso em bico de pena, sua aquarela, sua acrílica, suas gravuras em metal e linóleo, adentrando o simbolismo e o surrealismo, vão insinuando, dando vida e transformando alquimicamente as energias, as dimensões ocultas e inorgânicas, os seres arquetípicos. Irene Palulis volta à Polônia em 1987, para mais dois anos de estudos na Academia de Belas Artes de Varsóvia, recebendo orientações de Magiag, Jacek Dyrzynski e Marzanna Wróblewska. Realiza exposições individuais em Varsóvia e Cracóvia e participa de exposições coletivas nas mesmas cidades. De volta a Curitiba, aprofundou sua pesquisa em pintura com Heliana Grudzien e, com Léa Nancy Srenger, descobriu a Monoprint, técnica que, somada à incursão na linguagem abstrata, bem como à maturidade e síntese técnica e poética adquiridas, proporcionou-lhe um “fazer” singular, que batizou de “técnica própria”. Nesta, há sempre uma base em Monoprint que é composta pelos mais diversos materiais, como galhos de plantas que a artista encontra em seus passeios – lembrando-a do potencial de criação infinito da natureza –, ou aquilo que normalmente se considera “lixo”, como sacos de batata, restos de embalagens de papelão, papéis de bala, CDs quebrados etc. Tudo em sua arte pode ser aproveitado e ressignificado. Essa base vai sendo preenchida com desenhos a nanquim, giz pastel, lápis, entre outros, pinturas em aquarela, acrílica, estêncil e colagens. Segundo texto crítico de Heliana Grudzien, a pintura abstrata de Irene Palulis é fiel a uma construção e destruição de imagens sobre a tela. Como quem rastreia e funde formas espontâneas, metamorfoseando-as em plenitude visual, a artista transfere ao desenho sensações e fatos que habitam a sua vida interior, algo gestual-lírico-luminoso. Sem onde ancorar-se, a artista apenas desloca-se e fica sujeita ao jugo do resultado, que surge da separação e unificação de todos os elementos do desenho, e nos convida para um passeio de reflexão, roteiro este que ao mesmo tempo que nos une, nos fragmenta. Irene Palulis tornou-se tradutora e intérprete português-polonês, e atuou com esse fim em diversos eventos artísticos da comunidade polono-brasileira em Curitiba. Em 2018 recebeu como homenagem, por tantas décadas de vida dedicadas à arte e por tão vasta e diversificada produção, uma exposição retrospectiva no Museu de Arte da Universidade Federal do Paraná, de curadoria de Consuelo Schlichta, e documentário produzido por Tânia Bittencourt Bloomfield e Luís Carlos dos Santos, no âmbito dos projetos de extensão da Universidade Federal do Paraná “O artista na UFPR” e “Arte em vídeo na UFPR”. A exposição e o documentário têm o mesmo título: “Irena Palulis: humanidade, natureza, cosmos”. Vive em Curitiba.
(Coautoria: Heliana Grudzien e Ivi Belmonte)